terça-feira, 23 de outubro de 2007

Fotografia; Sérgio Santimano, Ilha de Mocambique 2003



ILHA DE MOÇAMBIQUE




Não é a pedra.

O que me fascina é o que a pedra diz.

A voz cristalizada,o segredo da rocha rumo ao pó.

E escutar a multidão de empedernidos seres que a meu pé se vão afeiçoando.

A pedra grávida a pedra solteira, a que canta, na solidão, o destino de ser ilha.

O poeta quer escrevera voz na pedra.

Mas a vida de suas mãos migra e levanta voo na palavra.

Uns dizem: na pedra nasceu uma figueira.

Eu digo: na figueira nasceu uma pedra.



Mia Couto

sábado, 20 de outubro de 2007

Frango Cafrial à Zambeziana



Ingredientes:
1 frango médio
1 coco ralado
8 dentes de alho
1 folha de louro
sal q.b.


Confecção:
Limpe bem o frango e deixe escorrer num passador.

Rale o coco para dentro de uma bacia plástica e, depois de ralado deite meia chávena de chá de água quente e meia de água fria, mexa muito bem com as mão até ficar um leite mais ao menos cremoso, deixe arrefecer, enquanto pila-se o alho e o sal.

Para temperar o frango, ponha-o num tabuleiro e tempere com o preparado e a folha de louro.

Uns minutos depois deite meia quantidade do leite do coco e fica a marinar por meia hora.

À parte, numa tijelinha junte o resto do leite de coco e um pouco de azeite.

Este frango é assado na brasa e de vez em quando, com uma pena de galinha vá borrifando o preparado de leite e azeite sobre o frango até estar pronto para servir.

Nota: O preparado de leite de coco e azeite é para que na altura de assar o frango na brasa a pele fique mais estaladiça.

sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Tragédia de Mbuzini


19 de Outubro de 1986;

O avião presidencial moçambicano despenha-se em Mbuzini, território sul-africano.

Morrem o presidente Samora Machel e 33 membros da sua comitiva.


Lucky Dube


Can you feel happy, when you see another man without food?...

Estou bastante chocado!
Morreu assassinado mais uma estrela do reggea.

Leia Aqui. Como dizia o próprio Lucky, we are living in this crazy world.
O músico notabilizou-se na luta pela causa social, sobretudo dos negros, numa África Sul dominada pelo apartheid, racismo e exclusão sócio-racial.

A actual tónica da sua música estava virada para a reconciliação entre os negros e outras raças e na luta para concretização da política do black empowerment.
Os problemas que tanto lutou para sua eliminação (a pesar de terem diminuído ou assumido novas formas) ainda continuam preocupação para o negro tanto em moçambique, na região e no mundo.
Ultimante, a segregação racial anda associada também à segregação social, numa situação em que as elites (sobretudo negras) que conseguiram tirar algum proveito pessoal das independências dos países, estão hoje num casamento muito forte com os que no passado fomentaram declaradamente o racismo e exclusão do negro.
Por isso, Lucky, a luta continua.
Paz à sua alma.
Jah Guide!

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Moçambique e Espanha



Completam 30 anos de relações diplomáticas
Notícias

MOÇAMBIQUE e o Reino da Espanha completam este ano 30 anos de relações diplomáticas, que se traduziram numa cooperação que até hoje desenvolvem em vários domínios.

Ao abrigo deste relacionamento, a 12 de Dezembro de 1980 os dois Estados assinaram em Maputo um Convénio Básico de Cooperação Técnico-científico, instrumento que viria a impulsionar uma longa e frutuosa cooperação entre as suas partes.
Semana passada, em Madrid, um grandioso evento cultural celebrou as três décadas de relacionamento diplomático entre moçambicanos e espanhóis.

Esse evento levou a actuar naquela capital europeia para uma “Semana Cultural Moçambicana” artistas como a Companhia Nacional de Canto e Dança (CNCD), o agrupamento musical Ghorwane, José Mucavel, WI e Sónia Mocumbi.


Também houve espaço para uma apresentação gastronómica de Moçambique, com o contributo de moçambicanos idos do país e outros que residem na diáspora.
A Semana Cultural Moçambicana foi organizada conjuntamente pela Embaixada de Moçambique em Madrid e pela Agência Espanhola de Cooperação Internacional.

Ainda no decorrer deste ano outro evento para comemorar o anivérsário das relações diplomáticas entre os Estados moçambicano e espanhol terá lugar em Maputo.

terça-feira, 16 de outubro de 2007

Foto; Sérgio Santimano, do livro
"Nacala"
"Era uma vez um porto, uma cidade e suas gentes"


Um sitio com vasta informacao sobre Mocambique.
A registar.
INDEKS Mocambique,
Redaccão PONTE

Mankell


Mankell ger bort 15 miljoner
Författaren Henning Mankell medverkar till att bygga en by för 150 föräldralösa barn i Mocambique.
Han betalar 15 miljoner ur egen ficka.
– Vad fan ska jag med en massa pengar till. Det finns 800 000 föräldralösa barn i landet. Jag kan inte hjälpa alla. Men det är ingen ursäkt för att inte hjälpa några, säger Henning Mankell till Aftonbladet.
Byn ska döpas efter Mankell.



traducão;
Mankell dá 15 milhões de croas.
Escritor Henning Mankell contribui para a construcão de uma aldeia para 150 criancas orfans em Mocambique.
Ele contribui com 15 milhões do seu próprio bolso.
-O que posso fazer com tanto dinheiro.
Existe mais de 800 mil, criancas orfans no País.
Eu não posso ajudar todas.
Mas isso, não pode ser desculpa para não ajudar nenhuma, disse Henning Mankell ao jornal sueco Aftonbladet.

A aldeia chamar-se-há Mankell.



Redaccão PONTE

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Infância


Foto; Sérgio Santimano- Colvá- Goa/Índia 2006

INFÂNCIA


Sempre o mesmo desejo
de voltar às praias da infância:

argúcia dos dedos na areia
alegria dos olhos na espuma…

Mas como voltar aos trilhos apagados?
E como voltar às fontes incendiadas?
(ao invés deste desejo eis-me espiando o futuro que nunca vivo!)


Armando Artur

Samora Machel recordado em festival cultural


Notícias

ARRANCA quarta-feira, até o próximo dia 21 do mês em curso, em Maputo, a quarta edição do Festival Cultural Samora Machel, promovido pelo Centro de Documentação Samora Machel e a ArtSocial.
Com efeito, vários músicos moçambicanos foram convidados para abrilhantar o evento, que irá decorrer no Centro Cultural Franco-Moçambicano e nos espaços de promoção musical como o Mbuva, Big Brother e Gil-Vicente. A iniciativa contará com a exibição de artes plásticas, artesanato, fotografia e promoção literária, bem como debates e palestras sobre a vida e obra do primeiro presidente de Moçambique independente.
Este festival, que junta anualmente fazedores da arte, intelectuais e sociedade civil, é uma forma activa que serve para perpetuar a imagem daqueles que pereceram no trágico acidente aéreo de Mbuzini, ocorrido a 19 de Outubro de 1986, e que vitimou, dentre outras figuras, Samora Moisés Machel.
De quarta a sexta-feira, o Gil Vicente vai acolher os concertos de Rodália e João Paulo, Eyuphuro e Xidiminguana, respectivamente.
Assim, o Centro Cultural Franco-Moçambicano será palco da projecção do filme sobre vida e obra de Samora, que terá lugar no dia 19 às 20 horas.
Está também programado para o mesmo dia e local o concerto dos músicos Hortêncio Langa, Roberto Isaías e Lizha James.
O Big Brother será palco, sábado a partir das 22 horas, do concerto dos Sáldicos, Garimpeiros, Jeny, Liloca e Mega Júnior.
E no domingo, o Mbuva, situado no Bairro do Aeroporto, abrirá as suas portas para actuações de Simba Met Rocats e Roberto Isaías com a sua banda.

domingo, 14 de outubro de 2007

Festa convívio



A Ponte
Associação dos moçambicanos residentes na Suécia e seus amigos.....
Vänskapsföreningen Mocambique/Sverige

27 Outubro
Flaggskeppet, Hagalundsgatan 9, Solna

Com música, dança, gastronomia do nosso Moçambique e muito, muito, mais!!!!!! .....

100kr/sócios e 150kr não sócios

Por questões organizacionais, queira por favôr confirmar com seu nome e número de pessoas para o e-mail da Ponte, ou fazer o pagamento, mencionando “festa Ponte 27-10.2007”.
PlusGirot 43 45 62-5

27oktober
Flaggskeppet, Hagalundsgatan 9, Solna
Med musik, dans, Mocambiquansk mat och mycket, mycket mer....
100:-kr medlemmar och 150:-kr ick medlemmar

PlusGirot 43 45 62-5 Bekräfta via e-post eller betala till vårt plusgirokonto, skriv på inbelningsblanketten "fest Ponte 2007-10-27".

e-mail ponte.moc.swe@gmail.com





Culinária


Caril de camarão ingredientes:


2 Kg de camarão
4 Tomates médios pelados
2 Cebolas médias picadas
4 Dentes de alho picados
2 Folhas de louro
6 Cravinhos da Índia
1 Porção de gengibre
1 Pau de canela
1 Coco ralado misturado com uma colher cheia de tamarindo esmigalhado e junta-se a um litro e meio de água a ferver e côa-se num pano para uma tigela
2 C.de chá de coentros
2 C.dechá de cominhos
½ De chá de açafrão
1 C.de chá de colorau
1 c .De chá de piri-piri
Sal (q.b.)
1 Colher de chá cheia de tamarindo.


Preparação:Lava-se, limpa-se o camarão.

Numa panela juntam-se o tomate, a cebola, alho, louro, cravinho, gengibre e óleo.

Põe-se tudo a refogar muito bem, juntamente com pequenas porções de água a ferver.

Depois de cozido, junta-se um pouco de leite de coco. Deixa-se cozer muito bem, acrescentando-se leite de coco sempre que necessário.

Finalmente deita-se o camarão, e deixa-se ferver em lume brando, acrescentando-se o resto do leite de coco até ficar um molho grosso e bem apurado.
Serve-se com arroz branco solto ou com arroz cozido em água do leite de coco.
Bom apetite;
S.S.

Portais de partidos políticos moçambicanos

Foto; Sérgio Santimano "Terra incógnita" Marrupa, escola secundária, Niassa 2003



Eis algumas notas de análise dos portais dos três partidos que os possuem no país:

PDD: indicação bizarra de que está em construção desde 2004, não é actualizado desde esse ano, é desse ano que datam uma mensagem, um comunicado de repúdio e uma viagem do presidente do partido, Raul Domingos, ao sul do país; nada consta nas "organizações especiais": juventude e mulher; na biografia do presidente, aparece desnecessariamente a expressão "gabinete do presidente"; no arquivo fotográfico, é visível a hegemonia de Domingos; não dispõe de uma secção para comentários e debate instantâneo; portal visivelmente abandonado.

Renamo: portal em bem melhores condições do que o do PDD, mas sem actualização desde 20 de Setembro; design leve, agradável; tem um laivo de voz individualizada na pessoa de Fernando Mazanga ("A semântica da minha detenção pela PRM"); no canto esquerdo, anuncia os resultados das eleições legislativas de 1999, mas quando se clica no elo surge um comentário desactualizado sobre as eleições provinciais inicialmente marcadas para 20 de Dezembro; várias secções do lado direito não estão preenchidas (gabinetes central e provincial, vogais); a rádio oficial do partido (Terra Verde) está afixada no canto esquerdo; não tem uma secção para comentários e debate instantâneo.

Frelimo: actualizado até ao dia 12 deste mês; design agradável; estilo uniforme, pesado, sem qualquer concessão à individualização opinativa; porém, afixa a ficha técnica e sabe-se que é Edson Macuácua o responsável do portal; bem mais preenchido em termos de secções do que o da Renamo; exibe publicações e remete para elos como bancada parlamentar, célula do Ministério para a Coordenação da Acçcão Ambiental (estranho apenas surgir esta célula), governo de Moçambique e presidência da República; a rádio do partido, há dias surgida, não está afixada; não tem uma secção para comentários e debate instantâneo; um portal sem erros técnicos, regularmente trabalhado.
Carlos Serra

sábado, 13 de outubro de 2007

Probabilidade de forte abstenção


As eleições multipartidárias de 2004 foram marcadas por uma elevada abstenção (apenas votaram 43% dos potenciais eleitores).

Mas foram, também, marcadas por profundas irregularidades.

Agora, com a novidade de um recenseamento digital, num processo claramente comandado pela improvização, sem preparo atempado, muitos computadores estão avariados e outros nem sequer chegaram ainda aos postos.

Talvez estejam recenseados apenas 6% dos eleitores passadas mais de duas semanas de recenseamento. Gente houve que quis votar e não pôde ou que desistiu ao fim de muitas horas de espera. Esta gente servirá como caixa de ressonância desmotivadora na rádio rua do nosso país.

E esta caixa de ressonância (que guarda, ainda, a memória dos problemas, dos desânimos das eleições anteriores), essa bola não de neve, mas savaneira de chuva e calor, agirá não contra a Comissão Nacional de Eleições ou contra o Secretariado Técnico de Administração Eleitoral em si, mas contra o Estado em geral, contra algo que será considerado desorganizado e chato.

Em 2008 teremos as eleições. Depois seguir-se-ão mais eleições, as autárquicas, as legislativas e as presidenciais. Um enfarte eleitoral num país marcado por um outro tipo de enfarte: o dos slogans.

Em livro de 1998 - tantos anos passados, vejam lá - analisei muitas das causas da forte abstenção então verificada. Falei, nessa altura, de eleitorado incapturável. Creio que as eleições que vão suceder-se em 2008 e 2009 serão ritmadas por um eleitorado fortemente incapturável. Por um potencial cansaço de promessas e de slogans. Mas sustentar isto tem apenas a novidade de o não ser.

Critiquem-me se estiver errado.

Carlos Serra

Amilcar Cabral - Uma Biografia


As edições "Tinta-da-China" vão lançar no dia 24 deste mês o livro "O Fazedor de Utopias, uma biografia de Amilcar Cabral", de um escritor angolano, António Tomás.
Bárbara Bulhosa, responsável pela "Tinta-da-China", teve a amabilidade de me mandar um e-mail contendo não apenas alguns elementos informativos como o próprio texto.
Fico extremamente agradecido.
Não apenas a ela, mas ao António Tomás pela sua iniciativa, já que Amílcar Cabral - quanto a mim o mais lúcido e inteligente lider africano da era moderna - está há demasiado tempo esquecido.

Os africanos raramente falam do seu exemplo, dos seus ensinamentos e nunca procuram neles o caminho para a solução de problemas verdadeiramente inacreditáveis - veja-se o que aconte por esta altura na Guiné Bissau, exactamente a pátria que Amílcar libertou.

Leston Bandeira

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Da Judy B. (Paris)

Foto; Sérgio Santimano ( fotografias de viagem, Paris 2006)

J'AI ÉCRIS TON NOM
J'ai écris ton nom ...
Sur un morceau de papier,
Mais... par accident , j'ai perdu le papier.
J'ai écris ton nom.... dans ma main,
Mais... quand je me suis lavé les mains...
Il a disparu.
J'ai écris ton nom ... sur le sable,
Mais... la vague l'a effacé.
MAIS,
J'ai écris ton nom dans mon coeur...
Il y restera gravé pour toujours !!!

Fotografias de Viagem

Foto; Sérgio Santimano "fotografias de viagem, Lisboa 2007)
"O professor medíocre descreve,
O professor bom explica,
O professor óptimo demonstra e
O professor fora de série inspira ...

"William Arthur Ward

terça-feira, 9 de outubro de 2007

Che Guevara foi executado há 40 anos

Faz hoje 40 anos que Che Guevara foi executado.


Estive em Cuba em 1997 (10 dias).

Posso dizer, que devo ter sido um dos primeiros Mocambicanos a visitar este País depois da Independência...

O meu objectivo entre outros, era sentir mais de perto a atmosfera de um continente aonde o nome do Che, a sua imagem e a sua dedicacão me fascinava e desta zona pertencia (América Latina) e tinha estado (lutado)....

Fui e trouxe uma foto dele, encontrado por mim nuns arquivos ICAIC (Instituto Cubano de Arte e Indústria Cinematográfica) e depois oferecida.
Publicarei a foto de que falo, logo que a encontre e que esteve no meu apartamento em Maputo durante os anos 70-80s.
E que fazia eu no ICAIC?
Eu nesse tempo era contabilista e fora de horas, frequentava e fui da direccão do Cine-Clube de Maputo.
Como não podia ir como turista, fui para visitar os cine-clubes Cubanos...mais ou menos assim.....recordacões....
Lá, era muitas vezes confudido com um cubano da zona Oriental....
É isto!
Um abraco
S.Santimano
Confira aqui. Oiça-o aqui.

Livro

Foto; Sérgio Santimano da série "Caminhos-1992-1993"



“No Coração da Noite”


de Armando Artur





Ao prefaciar “Os Dias em Riste” de Armando Artur, em 2002, sublinhei, na altura, alguns aspectos que caracterizavam a forma do autor fazer e de estar na poesia: constância, intimismo, leveza, equilíbrio e simplicidade, mas sempre com um apurado sentido de profundidade.


Lendo, hoje, passados cinco anos, “No Coração da Noite”, seu último livro, entendo que se os aspectos atrás referidos continuam presentes – o que valoriza sobremaneira a sua obra, do ponto de vista de permanência e de uma fidelidade intrínseca –, outros elementos há que emergem e que representam uma curva evolutiva da sua escrita.
Em relação à obra que temos, neste momento, em mãos, começaria, em primeiro lugar, por me referir à composição obtida na articulação entre a palavra e a imagem, onde os poemas se casam com os desenhos da autoria de um poeta da imagem que dá pelo nome de Ídasse Tembe.
Aí, surpreendemos um diálogo cúmplice e interactivo que obriga o leitor a procurar e a encontrar múltiplos e desconcertantes sentidos entre os versos e os traços das figuras representadas, numa envolvente demonstração de que a poesia enquanto expressão da modernidade é uma experiência permanente sobre os materiais que lhe dão forma, isto é, sobre os seus próprios processos de construção.
O segundo elemento que vejo destacar-se, nesta obra, assenta no poder figurativo da metáfora. Alguns exemplos: “No Coração da Noite”, suor dos mangais (p. 12), perfume de cio (p. 13), oferenda divina (p. 34), grinalda de quimera (p. 41), janela da tarde (p. 52), etc.
Metáfora transversal e estruturadora de toda a obra é certamente aquela que dá título à obra: “No Coração da Noite”.


Esta acaba por cumprir múltiplas funções:
Celebração da vida e da poesia pois é aí onde tudo parece começar, terminar e recomeçar e que faz desse lugar-tempo uma dimensão privada, profana mas também sagrada onde se esconde e se revela o mistério da criação: “É no coração da noite/ Que tudo principia” (p. 12).
Lugar de dispersão, de exílio, de partidas, mas também de regressos: “No coração da noite/ Recomeça o exílio voluntário [...] Sobre os limites da vida/ E da morte, eis-me pois/ Nos carreiros do regresso” (p. 49)
Lugar de transições entre a vida e morte, entre a palavra e o silêncio, entre a esperança e o nada, entre a solidão e o mundo, entre o esquecimento e a memória: “No coração da noite/ Há uma lembrança em contracção./ E há lágrimas sobre a capulana rota./ O soluço e a solidão agonizam/ Sob o tecto falso” (p. 19).
O terceiro elemento relevante neste livro de Armando Artur tem a ver com a convocação de alguma memória literária, aquilo a que nos habituamos a chamar de intertextualidade.


É uma memória que nos surge ora de forma explícita, com a nomeação de autores de referência, ora de forma implícita, através de insinuações de títulos, versos e palavras emblemáticos resgatados dessa mesma tradição literária.


Trata-se, no essencial, de uma expressão celebrativa das leituras do poeta e que são, ao mesmo tempo, legado pessoal e colectivo.
Finalmente, não podia deixar de fazer referência àquele que considero o grande salto da poesia de Armando Artur e que se prende com o apuramento da escavação interior, representando singulares inquietações filosóficas e existenciais.
Para uma rápida percepção deste facto, basta rastrearmos, por um lado, a profusão da interrogação ao longo da obra, uma espécie de consciência da erosão das certezas e das verdades absolutas que caracteriza o nosso tempo: “Mas como folhear estas laudas/ Com as mãos exangue?” (p. 16); “Senão há certeza/ Do lado de lá, por que não nos cantos/ E recantos da nossa homilia?” (p. 25); “(Afinal, para se ser/ não basta apenas nunca ter sido?)” (p. 30).
Outro indicador das inquietações lavradas nos poemas encontra-se na proliferação de termos ou expressões como “alhures”, “regresso ao nada”, “engulho do nada”; “nada”; “sensação do nada”, “parte nenhuma”, “nenhures”, etc.
O “nada” é ao mesmo tempo vácuo, angústia, busca, mas é sobretudo espaço de passagem, brancura de papel e da imaginação onde, como fogo de artifício, detonam as palavras que confluem "No Coração da Noite".


Sem cair no nilismo ou na radicalidade negativa nitzscheana, o sujeito parece claramente perseguir sentidos que melhor o situam na poesia e na vida, especialmente aquela que se processa interiormente.
Esta é, pois, uma obra cujo gesto criador, celebrativo e questionador faz da poesia de Armando Artur uma experiência sempre renovada de fruição e de aprendizagem.


Para ele e para nós.


Por; Francisco Noa


http://ma-schamba.blogspot.com/

A talhe de foice

foto; Sérgio Santimano "da série; Ilha de Mocambique"



Por Machado da Graça
A mesma peça

Todos os anos eleitorais a cena se repete. A Frelimo e o seu Governo “descobrem” que existem uns homens armados em Marínguè. E “descobrem” também que esses homens são perigosíssimos para a paz.
E, portanto, como se avizinham as eleições provinciais, aqui está, de novo, a máquina de propaganda da Frelimo a agitar o fantasma dos tais homens armados.
Ora a mim parece que é muito mais do que tempo de acabar com este espectáculo tantas vezes em reposição que já ninguém o consegue mais aturar.
Até onde recordo os Acordos de Roma previam que tais homens deveriam ser integrados na Polícia.
Só que não foram.
E parece-me que não foram porque são úteis assim para as duas partes. Para a Renamo que os usa para guardar seja lá o que for que tem armazenado em Marínguè, em zonas onde o poder estatal não chega. Para a Frelimo porque vão podendo ser usados como papões destinados a assustar os moçambicanos.
Ora, verdade se diga, não tenho conhecimento de que esses tais homens armados tenham alguma vez, nos últimos 15 anos, disparado as suas armas seja contra quem for.
Ao contrário da Polícia, em relação à qual posso fazer uma lista, bastante longa, de inocentes que matou.
Portanto é muito mais do que tempo de se acabar com esta reposição regular de uma peça de teatro que já não interessa a ninguém. Já todos conhecemos o que os actores vão dizer a cada momento. Já todos sabemos que movimentos vão acontecer no palco.
Já todos sabemos, inclusive, que, acabado o período eleitoral, a peça volta a sair de cena por mais uns tempos, embora os cenários, guarda-roupa e adereços sejam guardados nos mesmos baús, cheios de traça, para voltarem a ser usados logo que volte a cheirar a urnas de voto.
Eventualmente os encenadores da peça ainda não perceberam que os espectadores já estão fartos.
Porque, se tivessem percebido, o assunto já há muito teria sido resolvido. Se 15 anos não chegaram para integrar umas dezenas de homens na Polícia não foi por falta de tempo. Foi por falta de vontade.
Falta de vontade dos dois lados.
E esses dois lados estão-se nas tintas para nós todos, os cidadãos do país.
Para conseguirem os seus objectivos, isto é os nossos votos, vão empurrando os tais homens armados de um lado para o outro, agitando-os como trunfos no seu jogo pelo poder.
E nós, homens desarmados, que não temos nem o poder de fogo dos da Renamo nem dos da Polícia (= Frelimo), ficamos no meio, olhando para uns e para outros, à espera que percebam o papel ridículo que andam há anos a fazer.
Coisa que, infelizmente, não parece estar para breve, a avaliar pelo entusiasmo que alguns dos actores cómicos continuam a demonstrar no desempenho do seu papel.
A única coisa que me parece poderia ser um aproveitamento positivo de tudo isto seria a criação de um Festival de Teatro de Maringué, a realizar-se todos os anos eleitorais, em que vários grupos se poderiam apresentar, sendo a sessão de encerramento, uma espécie de Gala, sempre a representação da peça Os Homens Armados da Renamo.
Assim como, em Mueda, durante muitos anos se representou a peça sobre o Massacre de Mueda, Maringué passaria também a ter o seu festival regular.
Isto para não falar de Zavala, onde o Festival de Timbila é também uma recordação de feitos guerreiros do passado.
Agora que, como argumento eleitoral, esta história dos homens armados da Renamo já deu o que tinha a dar, já.
Poupem-nos a paciência!



(Publicado no jornal Savana-05-10-07)

A partir de hoje: vendedores informais removidos à força

Recordando a "guerra" na Beira entre vendedeiras informais e polícias municipais .
"Nós, as mulheres, vendemos na rua para evitar o chamboco do homem sem sentimento sexual. E alguns homens que nós aceitamos porque também temos o desejo sexual, engravidam-nos e fogem deixando-nos com crianças desamparadas, alguns são desses membros da Polícia Municipal, conhecidos por alumwa (que pegam, agarram, mordem - em Chisena).
Estes têm farda verde, por isso chamamos também matapa (verdura), mas têm coração de ferro.
Para vendermos bem, temos espalhados os nossos filhos em vários pontos onde chegam os carros, já que os mesmos agora utilizam esse meio.
Os miúdos quando vêem o carro dos alumwa batem as latas, vêm a correr ou arrebentam balões dos preservativos JEITO, assim nos alertam de qualquer suspeita da Polícia Municipal.
Só que às vezes somos surpreendidas porque os miúdos também se metem em brincadeiras, mas quem consegue foge com o seu cesto ou com os produtos e eles agora não nos perseguem, só nos olham com olhar de leão esfomeado e às vezes alguns lançam um sorriso como quem diz: hoje te safaste, mas na próxima verás a minha magia e rasteira e vais cair na minha rede."
Inácio do Rosário

domingo, 7 de outubro de 2007

Dockanema e a nova fase do filme africano








Eleutério Fenita



em Maputo


Há quem tivesse descrito o festival como "uma oportunidade de reescrever a História escondida de África"
Entre 14 e 23 de Setembro, as cidades de Maputo e Matola acolheram a 2ª edição do Dockanema, o festival que reuniu a produção mundial de filmes-documentários, com um olhar muito especial para África.
Foi o caso de “Bamako”, o filme que marcou o início de uma fascinante viagem pelas realidades, verdades e imaginários trazidos para a tela por mulheres e homens como o realizador Abderrahmane Sissako, uma das maiores referências no mapa cinematográfico africano.
O celebrado cineasta do Mali, convidado de honra do Dockanema, acabou, ao relembrar a sinopse do seu filme no primeiro dia do festival, por recordar de certa forma a mensagem que o próprio evento passou.
O filme centra-se num julgamento realizado no pátio de uma casa em Bamako, capital do Mali, onde diferentes representantes da sociedade africana acusam o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional como sendo os responsáveis pelo subdesenvolvimento do continente.
Culpa institucional
Entretanto, a vida continua no bairro, em particular para uma cantora de nome Melé e para o seu marido, Chaka.
Bamako
Quis chamar a atenção para o futuro do continente, mostrar com este filme que África não é necessariamente o continente de miséria e de guerra mas um continente com consciência de si próprio

Abderrahmane Sissako, realizador
“Quis chamar a atenção para o futuro do continente, mostrar com este filme que África não é necessariamente o continente de miséria e de guerra mas um continente que tem consciência de si próprio e das suas dificuldades”, explicou o realizador.
Mas exactamente em que é que consiste o Dockanema? Quais os seus objectivos, de que panos é feito este evento que vai ainda na sua infância mas que já está a mexer em África e noutras paragens?
Pedro Pimenta, director do festival, observou à BBC que “em Moçambique, como noutras partes do mundo, há um certo hábito de ir ao cinema que desaparece. Uns apontam a televisão, os DVDs e os vídeos como sendo os culpados.
Abrir os olhos
“Nós achamos que Moçambique não teve capacidade de adaptar esse hábito à nova realidade. Hoje em dia não se pode esperar que as pessoas venham ao cinema, é preciso levar o cinema às pessoas.
"Dockanema propõe-se fazer isso, multiplicar os pontos de exibição e fornecer aos membros do público algo que não viram durante o resto do ano.
Todas as sessões do Dockanema, que custou 200 mil dólares a organizar, foram gratuitas.
Pedro Pimenta considerou que a programação cinematográfica audiovisual em oferta nos diversos canais de televisão, nos videoclubes e nos DVDs, não tratam desse tipo de matéria.
“A avaliação que nós fazemos é que existe potencialmente um público que está interessado em informar-se de uma maneira diferente, que quer sair um pouco da dominante do filme de acção, da telenovela, do futebol, sempre, sempre ao longo de todo um ano”, sublinhou.
História escondida
Todas as sessões do Dockanema, que custou 200 mil dólares a organizar num esforço de angariação que demorou um ano inteiro, foram gratuitas.
“No nosso entender, esta é, de momento, a opção certa, considerou.



A equação económica não estaria resolvida se pedíssemos às pessoas que pagassem um bilhete, porque conhecemos muito bem as condições socioeconómicas em que o país se encontra, onde muitos, dentro do seu limitado orçamento, têm de fazer escolhas, muitas vezes dolorosas”, apontou.
A afirmação da narrativa oral
O que distingue o Dockanema é que o cinema africano está a entrar numa nova fase e o que está a ser feito é reencontrar o discurso, a narrativa na primeira voz.



Mais do que recontar ou rescrever a História, trata-se de uma reafirmação de que as pessoas que viveram as histórias na primeira pessoa são perfeitamente capazes de as contar.

Claire Andrade-Watkins, realizadora
Há quem tivesse descrito o Dockanema como uma oportunidade de revisitar e se calhar até mesmo reescrever a História que, segundo os países africanos em particular, ainda permanece escondida.
Claire Andrade-Watkins, uma realizadora norte-americana de origem cabo-verdiana, trouxe para o Dockanema a longa-metragem “Será um Porto-riquenho Esquisito?”, sobre o desmoronar do tecido sócio-cultural de uma comunidade de imigrantes caboverdiana residente em Providence, nos Estados Unidos.
É uma história recordada e contada com mágoa na primeira pessoa pelos mais velhos que a sentiram na pele, na família e nos amigos.
“É o primeiro documentário sobre a experiência de cabo-verdianos na diáspora e serve como base para outras histórias de imigrantes cabo-verdianos que ainda não foram contadas. É o relato de uma comunidade cuja história foi apagada antes de ser escrita”, descreveu Andrade-Watkins.
Nova fase
Para a realizadora, “o que distingue e torna o Dockanema importante é que o cinema africano está a entrar numa nova fase e o que está a ser feito é reencontrar o discurso, a narrativa na primeira voz.
“Ngwenya, o Crocodilo", de Isabel Noronha sobre o pintor moçambicano, Malangatana Ngwenya foi um dos documentários mais apreciados na mostra.
Mais do que recontar ou rescrever a História, trata-se de uma reafirmação de que as pessoas que viveram as histórias na primeira pessoa são perfeitamente capazes de as contar. É a afirmação da narrativa oral”, excalmou.
Como uma das principais novidades do país anfitrião, a segunda edição do Dockanema teve “Hóspedes da Noite” de Licínio de Azevedo e “Ngwenya, o Crocodilo", de Isabel Noronha sobre a incontornável bandeira das artes plásticas africanas, o pintor moçambicano, Malangatana Ngwenya.
Embora o Dockanema seja sobre cinema, o festival não se resume apenas e unicamente a projecções de filmes, como explicou o seu director, Pedro Pimenta.
Fórum
“Um dos objectivos mais importantes do Dockanema é trazer para Maputo pessoas de diversos quadrantes no quadro de uma iniciativa a que chamámos o Fórum Dockanema. Todos os dias houve uma mesa redonda, um debate, um diálogo, uma palestra…”
A presença da mulher nas obras cinematográficas foi notória na mostra
A presença da mulher nas obras cinematográficas nesta segunda edição de Dockanema foi notória. Exemplos incluem “As Mulheres Vêem Muita Coisa” da holandesa Meira Asher, sobre três antigas crianças-soldado.
Houve também “Senegalesas e Islão”, da senegalesa Angèle Diabang Brener e ainda “Mulheres de Força” do realizador zimbabueano, Tsitsi Dangarembga, que aborda o estigma e a discriminação a que estão sujeitos os que, sendo seropositivos ou apenas familiares e amigos, decidem “dar a cara”.
Paola Rolletta, da organização do festival, descreveu o filme. “As protagonistas são duas mulheres com o HIV que usam a sua experiência com a doença como um fórum para a educação pública e a consciencialização. Uma era modelo e outra de meios mais pobres. A película mostra a realidade da vida das pessoas que enfrentam o problema.”
Outras janelas
No final de uma das sessões, espectadores anónimos fizeram o seguinte balanço:
“Eu diria que até certo ponto começa a surgir o ‘bichinho’ do cinema em Moçambique."
“É sempre bom ter uma nova perspectiva. O filme-documentário abre outras janelas sobre o mundo."
“Dantes tínhamos cerca de 60 filmes e agora temos 83.
Os moçambicanos devem aproveitar esta oportunidade.

Afinal, já estamos a fazer algum cinema e isso ajuda-nos a crescer.”

Viagem

Foto; Sérgio Santimano - Ilha de Mocambique 2002

Quem viaja também se perde.

Quem viaja também descobre que pode ser outro.

Quem viaja, também se encontra.

Conceicão Siopa - Maputo Outubro 2002
In "Luís Abelard
Viagem..."
(catálogo; photofesta 2002)

quinta-feira, 4 de outubro de 2007

04/10/2007


Moçambique celebra 15 anos de Paz
Celebra-se, hoje, 15 anos de assinatura do Acordo Geral de Paz que pôs fim à 16 anos de guerra civil em Moçambique. As cerimónias centrais tiveram lugar na capital do país, e foram precedidas pela deposição da coroa de flores na Praça dos Heróis Moçambicanos.
As celebrações iniciaram por volta das 09:00 horas da manhã e contaram com a participação dos principais actores das conversações que conduziram à assinatura do Acordo Geral de Paz.

No final, o presidente da República, Armando Guebuza, relembrou a importância e a necessidade de nos envolvermos no desenvolvimento económico e social do país.
Já o advogado Máximo Dias considera que o maior desafio para a consolidação da paz no país é o combate à pobreza absoluta.
Estas celebrações ocorrem numa altura em que voltou à ribalta o espectro dos homens armados da Renamo.
Mas para o Chefe de Estado há espaço para todos em Moçambique e não descarta nenhuma força para garantir a segurança do país.
A segunda parte das cerimónias foi marcada pelo plantio de árvores na Praça da Paz, pelos actores principais das conversações, nomeadamente, o Presidente da República, que chefiou a delegação do Governo nas negociações; o ex-chefe de Estado, Joaquim Chissano subscritor do acordo; Raúl Domingos, chefe da delegação da Renamo; Dom Jaime Gonçalves, facilitador; Dom Matteo Zuppi, mediador; entre outros intervenientes.
Por fim reuniram-se todos no pavilhão do Maxaquene. Aqui, se enalteceu o trabalho que estes mediadores tiveram no processo. Neste local, a cerimónia contou com orações de alguns religiosos das diversas congregações do país com destaque para a igreja universal que participa pela primeira vez num evento desta natureza.
Porém, ao se soltar a pomba branca, que representa a paz, está para a surpresa de muitos não elevou o voo para o alto do pavilhão, tendo apenas permanecido em voo rasante.
De referir que uma vez mais a Renamo não participou nestas cerimónias, afirmando de se tratar de uma fantochada, mas prometeu celebrar nos escritórios do partido.

Jornal o País